O que é?
O linfoma de Hodgkin (LH) é um tipo particular de linfoma, um tumor maligno do sistema linfático.
O sistema linfático é constituido pelos gânglios, medula óssea, baço e vasos linfáticos, onde circula a linfa, constituida essencialmente pelos linfócitos, as células responsáveis pela imunidade; existe no entanto tecido linfático em práticamente todos os orgãos. O linfoma ocorre quando há uma transformação maligna dos linfócitos. O linfoma de Hodgkin caracteriza-se pela presença de células típicas no exame do gãnglio – células de Reed-Stenberg e células de Hodgkin; essas células têm um antigénio da superfície designado CD30. Fig.1 e Fig 2;
Há vários tipos de Linfoma de Hodgkin?
Existem diversos tipos de LH de acordo com o aspecto do gânglio ao microscópio:
Linfoma de Hodgkin “clássico” – é o mais frequente e engloba 4 subtipos, com histologias diferentes:
- Predomínico linfocitário – cerca de 5% dos casos, é mais frequente nos idosos; o gânglio está invadido por pequenos linfocitos e algumas células de Reed-Sternberg.
- Esclero-nodular – cerca de 60-70% dos casos, ocorre particularmente nos mais jovens e é ligeiramente mais frequente no sexo feminino; tem melhor prognóstico com elevada possibilidade de cura. O gânglio tem a cápsula espessada e o interior com aspecto de nódulos. Podem persistir nodulos fibrosados após o tratamento. Geralmente a doença é limitada.
- Celularidade mista – cerca de 25% dos casos, ocorre frequentemente nas crianças e nos mais idosos. No gânglio encontram-se diversas células diferentes e muitas células de Reed-Sternberg. Neste tipo de LH a doença é habitualmente disseminada, com sintomas gerais e há compromisso da imunidade. A possibilidade de cura é elevada.
- Depleção linfocitária – muito raro, mais frequente nos idosos, havendo escassos linfocitos no gânglio e várias células de Reed-Sternberg de morfologia diversa.
Linfoma de Hodgkin nodular de predomino linfocitário – cerca de 5-10% dos LH, é mais frequente nos homens; nos gânglios existem muitos linfocitos, histiocitos e células de Reed-Sternberg com aspecto de pipocas. O crescimento é lento e pode evoluir para LNH.
Qual é a causa?
As doenças malignas são devidas a alterações de alguns dos genes que controlam o desenvolvimento das células. Na maioria dos casos não se conhece o que provoca essas alterações; em alguns linfomas há associação com algumas infecções, contacto prolongado com substãncias tóxicas, ou situações de imunosupressão, como ocorre nos doentes transplantados ou com VIH.
No caso do LH há uma maior incidência nas pessoas que tiveram mononucleose infecciosa, uma doença benigna causada pelo vírus de Epstein-Barr. Existe também associação com o VIH e com outro vírus, o HTLV.
É uma doença hereditária? É contagiosa?
Não é uma doença hereditária nem contagiosa.
É frequente?
É muito menos frequente que os linfoma não Hodgkin (LNH); a incidência é de cerca 3 novos casos/100.000 habitantes.Em Portugal estima-se que surjam 300 novos casos/ano. É ligeiramente mais frequente nos homens e tem dois picos de incidência – entre os 16-25 anos e entre os 60-70 anos.
Quais são os sintomas?
Os mais frequentes são o aparecimento de gânglios aumentados, geralmente na região do pescoço, mas também nas axilas e menos frequentemente nas virilhas. São indolores mas em alguns casos há dor com a ingestão de bebidas alcoólicas. É frequente também o aumento dos gânglios no mediastino, uma área entre os dois pulmões; neste caso surge muitas vezes tosse ou falta de ar e pode haver derrame pleural. O baço e o fígado também podem estar aumentados e provocar desconforto ou dor abdominal.
No linfoma de Hodgkin o envolvimento de outros orgãos é menos frequente que nos linfomas não Hodgkin. Podem surgir infecções devidas à alteração da imunidade.
Outros sintomas, designados por sintomas B, são :
- febre, por vezes elevada e que aparece e desaparece sem medicação
- suores nocturnos
- cansaço e falta de energia
- perda de apetite e emagrecimento
- prurido( comichão no corpo).
- alterações da pele.
Como se diagnostica?
Se apresenta alguns destes sintomas deve consultar o seu médico que o referenciará a um hematologista. Este especialista, após colher dados da sua história clinica e familiar, irá proceder à observação e pedir vários exames para esclarecer a situação.
O diagnóstico de linfoma é obtido por biópsia de gânglio ou de uma massa tumoral. A colheita de tecido tumoral permite o exame ao microscópio e outros estudos para caracterização do tipo de linfoma, como a imunofenotipagem e o estudo citogenético.
Por vezes o linfoma não é acessível pois está localizado dentro do abdomen ou do tórax; nesses casos o material é obtido por biópsia guiada pela TAC ou por cirurgia
A análise de uma pequena quantidade de tecido, obtida por citologia aspirativa, é igeralmente insuficiente para um diagnóstico correcto.
Que outros exames preciso de fazer?
Além da biópsia do gânglio são necessários vários exames como análises ao sangue, radiografias e TAC, PET (positron emission tomography), ECG e avaliação da medula óssea por mielograma e biópsia óssea.
O que são os estadios da doença?
Estadiamento consiste na avaliação da extensão da doença através dos exames referidos.
É utilizado o chamado Estadiamento de Ann Arborque estabelece os estadios I a IV. São designadas por E a presença de linfoma extra-ganglionar e por X, se a massa tumoral é muito volumosa.
É igualmente referida a presença ou não de sintomas gerais:
A – sem sintomas.
B – com sintomas: febre, sudorese, anorexia, emagrecimento > 10% do peso em 6 meses, prurido.
Qual é o tratamento?
O tratamento depende de diversos factores: tipo de linfoma de Hodgkin, estadio, idade, estado geral do doente e existência de outras doenças. Há diversas modalidades de tratamento que podem ser utilizadas e que geralmente incluem quimioterapia e um corticoide (derivado da cortisona). Em alguns casos de doença localizada pode ser usada radioterapia.
O esquema de quimioterapia mais utilizado é o ABVD – adriamicina, bleomicina, vimblastina e dacarbazina.
São habitualmente administrados três ciclos de tratamento ao fim dos quais é feita uma reavaliação que inclui o exame de PET. Dependente dessa reavaliação é continuado tratamento, habitualmente no total de seis ciclos, ou é escolhida terapêutica alternativa se a resposta não for a esperada. A percentagem de remissão completa é de 82% .
Outros esquemas como Stanford V - mecloretamina, adriamicina, ciclofosfamida, vincristina, bleomicina, etoposido e prednisona - ou BEACOPP - bleomicina, etoposido, adriamicina, ciclofosfamida, vincrstina, procarbazina e prednisona, são utilizados em alternativa, ou, em alguns casos, como 1ª opção.
Quais são as complicações do tratamento?
Os efeitos secundários podem ser controlados e são na sua maioria, reversíveis. Deve sempre relatar esses sintomas à equipe que o trata, para que actuem rápidamente e se evitem situações mais graves.
Sintomas habituais resultantes do tratamento:
É habitual a sensação de cansaço e falta de apetite.
A quimioterapia vai agravar a anemia pelo que podem ser necessárias transfusões de sangue.
Com o tratamento diminuem ainda mais os globulos brancos e portanto é maior o risco de infecções, que nos linfomas é já importante. As infecções, particularmente as pneumonias, são a causa de morte mais frequente nestas doenças. Deve recorrer ao seu médico se surgirem febre ou outros sintomas, como arrepios, tremores, tosse, expectoração, falta de ar, queixas urinárias ou diarreia, e deve evitar contacto com pessoas com gripe ou outras doenças contagiosas. Uma das infecções frequentes é a "zona" provocada pelo vírus herpes-zoster, que se manifesta por dor ou sensação de queimadura numa zona da pele, com aparecimento de pequenas vesículas e que requer tratamento imediato.
Podem surgir pequenas hemorragias na pele, ou nódoas negras, assim como hemorragias do nariz ou gengivas pela diminuição das plaquetas (trombocitopénia). Se o valor for muito baixo pode ter de levar transfusões de plaquetas.
A quimioterapia provoca muitas vezes enjoo e vómitos, mas actualmente existem medicamentos muito eficazes para combater estes sintomas.
A queda de cabelo é reversível e muitas vezes o cabelo nasce mais forte. A pele fica mais sensível e deve evitar exposição ao sol. É importante manter a pele hidratada e tratar as infecções da pele ou das unhas.
Podem surgir aftas ou lesão da mucosa da boca – mucosite.
A diarreia ou prisão de ventre são frequentes.
Os corticoides aumentam o risco de infecções e levam a um maior apetite com aumento de peso e o aparecimento de “ cara de lua cheia”; este efeito é, regra geral, completamente reversível. Aumentam também a glicémia, a retenção de liquidos e a tensão arterial. Por vezes causam irritabilidade e insónias e pode necessitar de medicação para controlar estas situações.
Pode haver de imediato um aumento do ácido úrico, sendo necessário prevenção com um medicamento chamado alopurinol. É necessária correcta hidratação para evitar insuficiência renal.
Alguns citostáticos têm efeitos secundários particulares:
- Ciclofosfamida - alteração da cor da pele, cistite hemorrágica
- Doxorrubicina – alterações cardíacas
- Vincristina – neuropatia periférica. Diminuição do sódio no sangue (hiponatrémia)
- Bleomicina - fibrose pulmonar
Esta é uma doença frequente em pessoas mais jovens. Neste caso devem ser tomadas medidas anticoncepcionais, pois o risco de malformações no feto, provocadas pelo tratamento, é muito elevado. Estas medidas aplicam-se não só às doentes do sexo feminino, como também aos doentes do sexo masculino que tenham uma companheira em idade fértil.
Outra questão é a da fertilidade, que pode ficar diminuida, não só pelos medicamentos como também pelos tratamentos. Deve falar com o seu médico sobre a criopreservação de sémen, ou de ovócitos, de modo a poder vir a ter filhos mais tarde, se assim o desejar.
Como se avalia o resultado do tratamento?
Está recomendada reavaliação ao fim de 2-3 ciclos com PET-TAC, o que permite alterar a terapêutica precocemente, se não houver resposta satisfatória. Caso a resposta seja satisfatória são administrados um total de 6-8 ciclos após os quais se faz reavaliação.
E se houver recaída?
A recaída ocorre em cerca de 30% dos doentes e é tratada com um anticorpo monoclonal anti-Cd30, o brentuximab vedoitina, ou outros, como o nivolumab, ou ainda com quimioterapia, habitualmente diferente da utilizada inicialmente.
Em alguns casos mais agressivos pode ser realizado transplante de células estaminais.
É uma doença curável?
O objectivo do tratamento é a obtenção de remissão completa duradoura, ou seja o desaparecimento total dos sintomas e sinais da doença.O LH é um dos tipos de neoplasia com maior taxa de cura. Cerca de 75% de todos os doentes, particularmente os mais jovens (90%), ficam curados. Em alguns casos há recaídas, que obrigam a novo tratamento, e o número de novos medicamentos eficazes é cada vez maior.
Posso fazer a minha vida normal?
É muito importante que mantenha uma vida activa, com alimentação saudável, hidratação adequada e aconselha-se vivamente que deixe de fumar!
Deve ter especial atenção à prevenção e tratamento precoce das infecções, que são a principal causa de hospitalização e podem ser muito graves, pondo em risco a sua vida. Evite ambientes frios e húmidos, assim como demasiado aquecidos, locais com muita gente e contacto com pessoas infectadas.
Fale com o seu médico sobre a possibilidade de ter um antibiótico em casa, para a eventualidade de surgir febre, tosse, ou outros sintomas, e como poderá contactar rápidamente a equipe que o trata se for necessário.
Deve abordar a possibilidade de fazer algumas vacinas, como a da gripe e a vacina antipneumocócica. Outra medida que pode ser aconselhável é a de ginástica respiratória, particularmente se foi fumador ou se já teve infecções respiratórias de repetição.
Não deve esquecer o risco de outras neoplasias, fazendo o rastreio indicado para os tumores do tubo digestivo, pele e do foro ginecológico.
O apoio psicológico, familiar e o de outros doentes é fundamental e a APCL está ao seu dispor para os esclarecimentos e ajuda que necessitar. Pode encontrar algumas indicações úteis em “ Viver Melhor”.